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01-Nem
a rosa, nem o cravo 02-O
primeiro beijo 03-Inveja
04-O Mendigo
05-Lágrimas
06-A carta
07-Mistério
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08-Pelas
ruas da vida 09-O
Lugar do sofrimento 10-O
Destruidor de pensamentos 11-A
Serpente e o Vagalume
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12-O
Carpinteiro 13-Par de sapatos
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O Mendigo
Era domingo de manhã e o sol já o incomodava. Abriu os olhos,
sentou-se na cama e vestiu os chinelos. Olhou a sua volta, deu de
cara com o espelho e preferiu voltar a dormir. A vida havia sido
severa demais com ele naqueles últimos dias. Pôs a mão sobre a
fronha do
travesseiro e percebeu estar úmida. Envolveu-o nos braços e
apertou-o
fortemente, como se abraçasse alguém. Então, sentiu o perfume pelo
qual
havia se apaixonado, mas que agora virara apenas uma lembrança.
Tornou a deitar e molhou ainda mais a fronha. Hesitou, mas criou
coragem e
levantou-se. Coçou a barba, pegou os óculos em cima da cômoda e
desceu as
escadas. Sem dizer palavra alguma, deu um beijo na testa dos dois
filhos,
fazendo uma leve carícia nos cachinhos deles. Continuava quieto e de
cabeça
baixa. O filho menor aproximou-se e deu-lhe um beijo no ombro. Ele
sorriu e o
abraçou. Estava inseguro e desolado, mas tinha que se mostrar forte.
O outro
menino aproximou-se e também quis ser abraçado. Permaneceram durante
um
tempo naquele sofá. Queriam preencher o vazio de seus corações, mas
era
difícil.
A campainha tocou. Era o filho do vizinho que convidava os dois
meninos
para brincar. Mesmo sem muito ânimo, foram convencidos pelo pai com
o
pretexto de que aquilo lhes distrairia. Ficou sozinho. Deitou-se no
sofá e notou
uma garrafa de Whisky no alto da estante. Levantou-se, puxou uma
cadeira e
pegou a garrafa. Bebeu de uma só vez o que sobrava dela, o que foi o
suficiente
para fazê-lo dormir.
Por volta das três horas da tarde, os filhos chegaram. Entraram na
sala correndo.
Estavam suados e sujos de terra. Eufóricos. O pai abriu os olhos,
notou a presença
deles e fechou-os novamente. Voltou a sonhar. Os garotos corriam em
volta da
mesa e gritavam. Depois foram para os fundos.
Passado algum tempo, a campainha tocou novamente. Pensando ser o
filho do
vizinho, chamou pelos filhos, mas nenhum dos dois atendeu. Chamou-os
de novo,
desta vez mais alto, mas ainda assim não obteve resposta. A
campainha era
insistente e ele decidiu levantar. Passou diante do espelho e
ignorou as marcas feitas
em seu rosto pelas listras do sofá. Chegou ao portão e deparou-se
com um mendigo
que pedia comida. Ele respondeu que não havia nada para lhe
oferecer, mas o
pedinte insistiu, dizendo que sempre recebia um pedaço de pão com
manteiga e
leite com café da dona da casa. Disse também que aceitava qualquer
coisa, desde
que fosse da geladeira. O homem estranhou a exigência, mas tornou a
falar que não
tinha nada para ele comer, inclusive usou a desculpa de que tinham
acabado de
voltar de viagem, o que era mentira. A verdade é que ninguém mais
daquela casa
fazia compras e que o estoque de comida estava acabando, mas não por
falta de
dinheiro. O mendigo insistiu e começou a deixar o dono da casa
irritado. Então,
pediu nem que fosse um copo de água, mas tornou a exigir que fosse
da geladeira.
O homem, vendo que o pedinte só iria embora quando trouxesse algo,
resolveu ir
à cozinha. Passou pela sala e o filho mais velho perguntou pelo
irmão. Explicou que
estavam brincando de esconde-esconde, mas que não o achava de jeito
nenhum,
que até já tinha desistido de procurá-lo. O pai não deu muita
importância, deu
alguns passos e chegou na cozinha. De repente sentiu algo estranho,
um calafrio.
Deu mais alguns passos, pôs a mão na porta da geladeira e recordou o
sonho
interrompido pelo mendigo. Sonhou com sua mulher. Estava aflita,
querendo avisá-lo
de alguma coisa.
Finalmente, abriu a geladeira e encontrou o que menos esperava. Era
tarde
demais.
(Alessandra Marcuz de Souza Campos)
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