Poesias e Poemas
Carlor Drummond de Andrade

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          ( Os ombros Suportam o Mundo)

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.


Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.


Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
 

  Carlor Drummond de Andrade
 

              (Amor e seu Tempo)

        Amor é privilégio de maduros
         Estendidos na mais estreita cama,
         Que se torna a mais larga e mais relvosa,
         Roçando, em cada poro, o céu do corpo.

         É isto, amor: o ganho não previsto,
         O prêmio subterrâneo e coruscante,
         Leitura de relâmpago cifrado,
         Que, decifrado, nada mais existe

         Valendo a pena e o preço do terrestre,
         Salvo o minuto de ouro no relógio
         Minúsculo, vibrando no crepúsculo.

         Amor é o que se aprende no limite,
         Depois de se arquivar toda a ciência
         Herdada, ouvida. amor começa tarde.

        Carlos Drummond de Andrade
 

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