I
Já quis tentar formas novas
Foi mais ou menos em vão:
Hoje nestas velhas trovas
Falará meu coração.
II
Tudo que sinto e padeço
Posso descrever assim:
O prazer não tem começo
E a tristeza não tem fim
III
Trago há muito no sentido,
De que vem maior cuidado?
Será dum bem já perdido
Ou dum bem nunca alcançado?
IV
Dá-me essa voz tão amena
Para cantar este enlevo,
Ave que me deste a pena
Com que meus versos escrevo.
V
Tudo já me persuade
Que a ti já não me hei de opor:
Longes mata de saudade
E perto matas de amor.
VI
Anda a violeta chorosa
E a rosa alegre e faceta,
Só porque eu te chamei rosa
E não te chamei violeta.
VII
As estrelas no alto abrigo,
Mais alegre fico a vê-las
Todas as vezes que digo
Que teus olhos são estrelas.
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VIII
Das flores mais preciosas
O doce molho é composto
Não trago jasmim nem rosas,
Porque já os tem no rosto.
IX
Quanto é forte o meu desejo
Nesta afeição insensata:
Morro, porque te não vejo
E sei que ver-te me mata.
X
A pensar-me as vezes ponho
E não posso compreender
Porque sempre acaba o sonho,
Quando começa o prazer:
XI
Guardo penas inimigas
Nestas cantigas amenas
E quando canto as cantigas,
O coração sente as penas.
XII
Há no coração sombrio
Um eco brando e sonoro
Que adormece quando rio
E desperta quando choro.
XIII
Disto enfim já não duvido,
No mundo o maior cuidado
Vem do bem que foi perdido
Antes de ser alcançado.
XIV
Ó coração, quando choras,
Bate com arquejos lentos,
Marca o tempo, não por horas,
Mas sim por meus sofrimentos. |